Da mesma forma que uma régua permite medir distâncias marcando intervalos iguais de comprimento, um relógio é qualquer instrumento que permita medir o tempo, marcando intervalos de tempo iguais.
Qualquer fenômeno periódico, ou seja, que se repete sem alteração cada vez que transcorre um intervalo de tempo determinado (período), pode em princípio ser associado com um relógio. Assim um dos “relógios” mais antigos foi provavelmente associado com o nascer do Sol, definindo o intervalo de um dia. Galileu utilizou como relógio as suas pulsações (batimentos cardíacos).
Como sabemos que os intervalos de tempo marcados por um relógio são efetivamente iguais? A resposta é que não sabemos. Não adianta invocarmos a sensação subjetiva da passagem do tempo (tempo psicológico), que está associado a um “relógio biológico”, definido pelo ritmo de nosso metabolismo. Sentimos o tempo passar bem mais depressa em companhia de uma pessoa atraente do sexo oposto do que numa sala de aula, por exemplo! Sabemos também que os dias medidos do nascer do sol têm duração variável conforme as estações.
Tudo que podemos fazer é comparar relógios diferentes e decidir, através de tais comparações e de argumentos teóricos sobre as leis que governam o fenômeno periódico, qual relógio merece maior grau de confiança. Assim, ao definir a duração do dia pelo período de rotação da Terra, temos a possibilidade de comparar este movimento periódico com outros “relógios” astronômicos: os períodos de rotação da Terra em torno do Sol, da Lua em torno da Terra, de Mercúrio e Vênus em torno do Sol, dos satélites de Júpiter em torno do planeta. Observações muito precisas mostraram concordância destes outros “relógios” entre si e pequenas discrepâncias com a rotação da Terra, levando à conclusão de que esta rotação é sujeita a pequenas irregularidades, da ordem de uma parte em 108. Um dos fatores responsáveis por elas é o efeito de atrito associados com as marés.
[Figura 1: Relógio de Sol]
Atribuindo agora à palavra “relógio” o sentido específico de um instrumento construído para medida do tempo, os relógios mais antigos conhecido são os relógios de sol, que ainda são encontrados em nossos dias ornamentados jardins. Os mais simples deles baseiam-se no comprimento da projeção da sombra de uma estaca sobre uma escala graduada, O quadrante solar, um pouco mais elaborado, projeta a sombra de um ponteiro sobre um quadrante graduado. Os relógios solares apresentam o inconveniente de só poderem funcionar durante o dia e de marcarem horas não muito iguais.
No antigo Egito e Babilônia já eram empregados “relógios de água” (clepsidras), baseados no escoamento de um filete de água, através de um pequeno orifício no fundo de um recipiente, para outro recipiente contendo uma escala graduada:
[Figura 2: Relógio de água]
Um dispositivo semelhante foi utilizado por Galileu em experiências básicas de mecânica. Os “relógios de areia” (ampulhetas), baseados num princípio análogo também são empregados até hoje.
Nenhum método mais preciso de medir pequenos intervalos de tempo era conhecido até 1581, quando Galileu, comparando as oscilações de um lustre da Catedral de Pisa com o ritmo de seu pulso, descobriu o isocronismo das oscilações do pêndulo, ou seja, que o período das oscilações permanecia o mesmo, embora a sua amplitude fosse diminuindo (Galileu, que naquela época tinha 17 anos e era estudante de medicina, aplicou logo esse resultado em sentido inverso, construindo um “pulsômetro”, pêndulo de comprimento padrão destinado a tomar o pulso dos pacientes em hospitais). A partir dessa época, começaram a ser construídos relógios de pêndulo, acionados por pesos, e também relógios acionados por uma mola espiral, antecessores dos atuais.
O estímulo principal para a construção de relógios mais precisos veio do problema da determinação da longitude. Este problema se reduz diretamente ao de comparar a “hora local” com a hora de “Greenwich”. Como a Terra gira em torno de seu eixo de 360° em 24 horas, uma variação de 1 hora da data local corresponde a um deslocamento de 15° de longitude (=360° / 24), ou seja, cada grau de longitude equivale a uma variação de 4 minutos da hora local. Levando em conta o sentido de rotação da Terra (do Oeste para o Leste), vemos, por exemplo, que, quando é meio-dia em Greenwich, a hora loca verdadeira em São Paulo (longitude 46°39’O) é alguns minutos antes das nove horas da manhã (para fins práticos, toma-se a mesma hora local convencional em todos os pontos de um mesmo fuso horário; no caso, a diferença de hora local convencional seria de 3 horas).
Para determinar a longitude na navegação, bastaria, portanto, transportar a bordo no navio um relógio acertado pela hora de Greenwich, e compará-lo, por exemplo, com o meio-dia local (sol a pino). Mas isto requer um relógio de grande precisão, pois um erro de 1 minuto no tempo equivale a um quarto de grau:
Logo, se um navegador quisesse determinar a longitude com erro menos que 0,5° (aproximadamente 56km) depois de uma viagem de 6 semanas o relógio não poderia adiantar ou atrasar mais do que e minutos em 42 dias, ou seja 3 segundos por dia!
A importância prática do problema pode ser ilustrada pelo fato de que um Tratado como o de Tordesilhas (1493), dividindo as terras do globo entre Portugal e Espanha, tinha efeitos meramente acadêmicos enquanto não pudesse determinar que terras estivessem situadas a leste ou a oeste de um dado meridiano. Em 1714, o Parlamento inglês ofereceu o maior prêmio jamais oferecido até aquela época (₤20.000) a quem inventasse um método prático de determinação da longitude com erro < 0,5°. Newton, Leibniz e outros cientistas ilustres não haviam conseguido resolver o problema.
Finalmente, ele foi resolvido por um carpinteiro inglês chamado John Harrison, com a construção do seu “cronômetro marítimo”. O problema mais difícil era o de compensar os efeitos da dilatação da mola espiral devido a variações de temperatura. Após mais de 30 anos de trabalho, Harrison chegou a seu “Modelo 4”, que foi testado em 1761, numa viagem de Porstmouth à Jamaica. Decorridos mais de 5 meses de viagem, o relógio só se tinha desviado de 1min 53,5s, satisfazendo amplamente às condições exigidas. Assim mesmo, o prêmio não foi pago! Harrison só recebeu a metade em 1765, após um segundo teste, em que o erro foi < 0,1s por dia em 156 dias. Acabou recebendo a segunda metade em 1777, por intervenção do rei George III.
A precisão do cronômetro marítimo de Harrison era da ordem de 1 parte em 105, comparável à precisão de um moderno relógio “elétrico”, baseado nas vibrações de um diapasão e nas oscilações elétricas de um circuito. Um relógio de pulso de quartzo, baseado em oscilações de um cristal de quartzo submetido a um campo elétrico, tem usualmente uma precisão da ordem de 1s por mês, ou seja, aproximadamente 3 partes em 107, mas relógios mais sofisticados baseados em osciladores de quartzo atingem precisão da ordem de 1 parte para 108.
Num “relógio atômico”, utiliza-se como padrão de freqüência uma freqüência característica associada a uma radiação (na região de microondas) emitida por átomos de césio 133, que, por sua vez, controla oscilações eletromagnéticas na região de microondas e um oscilador de quartzo. A precisão do atual padrão primário de tempo (NIST – F1) é de 2 partes em 1015 (1s em 20 milhões de anos!).
Com o relógio atômico, tornou-se fácil detectar as irregularidades da rotação da Terra. Até 1956, a definição da unidade de tempo (s) se fazia em termos do dia solar médio, a média sobre um ano da duração do dia (de meio-dia a meio-dia) com:
Em 1956, tendo em vista as irregularidades na rotação da Terra, adotou-se uma definição baseada na duração do ano (período de revolução da Terra em torno do sol), mas, levando em conta que este também é variável (de forma conhecida com grande precisão), relativa à duração do “ano tropical” 1900 (1 ano tropical é o intervalo entre duas passagens consecutivas do Sol pelo equinócio de primavera). Assim, 1 “segundo das efemérides” foi definido como a fração do ano trópico 1900:
Finalmente, em 1967, foi decidido definir também o segundo em termos de uma radiação atômica característica. A definição atual do segundo é:
1s é a duração de 9.162.631.770 períodos da radiação característica do césio 133 que é empregada no relógio atômico.
São comumente empregadas as seguintes designações para frações de 1s:
1ms (milissegundo) = 10 – 3s
1µs (microssegundo) = 10 – 6s
1ns (nanossegundo) = 10 – 9s
1ps (picossegundo) = 10 – 12s
1fs (femtossegundo) = 10 – 15s
1as (atossegundo) = 10 – 18s
A tabela abaixo nos dá uma idéia de escalas de tempo abrangidas pela Física.
[Tabela 1]
Referências:
[1] Física Básica, H. Moysés Nussenzveig
Veja mais:
Medidas de Tempos Muito Longos
O Tempo Absoluto de Newton
O Movimento de Precessão da Terra
EDO: Técnica de Datação por Carbono 14
Muito interessante!
ResponderExcluirExcelente Kleber! Gostei bastante do seu blog! ;)
ResponderExcluirOlá amigo, eu que agradeço por sua visita e comentário!
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