A descoberta no século $V\ a.C.$ da existência de grandezas incomensuráveis (como a diagonal e o lado de um quadrado) abalou a matemática grega, dado o peso que meça tinha a escola pitagórica. Afinal esta escola apoiava-se na convicção de que o universo numérico não ultrapassava o que hoje chamamos de conjunto dos números racionais estritamente positivos. Ademais, o espírito do povo grego era muito diferente do povo babilônio, por exemplo, que aceitava as aproximações de números irracionais acaso surgidos em algum problema sem questionamento de ordem teórica. Os pitagóricos, por não encontrarem uma saída matemática satisfatória para o impasse, limitaram-se sempre, no caso de razões, àquelas entre grandezas comensuráveis.
A primeira teoria da proporções, envolvendo grandezas incomensuráveis, é a obra de Eudoxo (aproximadamente $408$ a $355\ a.C.$). Natural de Cnido, colônia grega situada na Ásia Menor, Eudoxo é considerado, depois de Arquimedes, o maior matemático da Antiguidade.
Muito jovem, deixou sua cidade natal para estudar Geometria com o pitagórico Arquitas. Depois seguiu para Atenas, onde estudou filosofia na Academia de Platão. Muito pobre, optou por morar na cidade de Pireu, a duas milhas de Atenas, onde a pensão era mais barata, fazendo a pé, todos os dias, o caminho de ida e volta à Academia. Esteve também meio ano no Egito aprendendo e depois fundou, em Cízico, uma escola que teve muito êxito. Com cerca de $40$ anos de idade voltou em visita a Atenas, acompanhado de alguns alunos, sendo recepcionado por Platão com um banquete. Retornou por fim a Cnido para ensinar e participar da vida da cidade, terminando seus dias cercado de prestígio.
A solução encontrada por Eudoxo para o problema da incomensurabilidade, embora brilhante, tinha como sério inconveniente o fato de ser meramente geométrica, o que contribuiu fortemente para que nos dois milênios seguintes a Geometria se tornasse praticamente a única base de rigor da Matemática.
Eudoxo introduziu a noção de grandeza para representar genericamente coisas como segmentos, ângulos, áreas, volumes e tempo, por exemplo, e a ideia de múltiplo de uma grandeza segundo um número natural não nulo. Assim, se $a$, $b$, $c$ e $d$ são grandezas ($a$ e $b$ da mesma espécie; $c$ e $d$ também da mesma espécie), o conceito de proporção segundo Eudoxo (e que irá figurar nos Elementos de Euclides como definição $5$ do livro $V$) é o seguinte:
Sendo $a/b=c/d$ se, e somente se, para quaisquer números naturais não nulos $m$ e $n$:
$$(ma=nb \Longrightarrow mc=nd)\\
\ \\
\text{ou}\\
\ \\
(ma > nb \Longrightarrow mc > nd)\\
\ \\
\text{ou}\\
\ \\
(ma<nb \Longrightarrow mc<nd)
$$
Com isso, no fundo, o conjunto dos números racionais maiores que zero fica dividido em duas classes, aquela dos quocientes $m/n$ tais que $ma \leq nb$ e a dos quocientes $m/n$ para os quais $ma>nb$. Escapou aos gregos destacar o ente definido por essas classes, ou seja, o número real $\alpha$ que é a medida de $b$ em relação a $a$.
Outra criação importante de Eudoxo foi chamado (atualmente) método da exaustão para determinar áreas e volumes de figuras curvas. Tal método baseia-se, em última instância, num postulado que leva o nome de Arquimedes, mas que, segundo este, é devido a Eudoxo:
"Dada duas grandezas não nulas de mesma espécie, sempre há um múltiplo de uma que supera a outra".
Com isso, Eudoxo pôde provar, por exemplo, que as áreas de dois círculos estão entre si como os quadrados de seus raios e os volumes de duas esferas como os cubos de seus raios.
Resultados como esses, embora notáveis, por não se traduzirem em métodos numéricos, pões em relevo a face negativa da matemática de Eudoxo.
Texto de: Hygino H. Domingues
Referências:
- Fundamentos de Matemática Elementar V1 - Conjuntos e Funções - Gelson Iezzi e Carlos Murakami
P#$% site, parabéns aos envolvidos.
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