06/07/2024

O princípio da indução finita

O princípio da indução finita é uma ferramenta usada para provar proposições que se aplicam a todos os números naturais. Sua essência está na ideia de que, se pudermos provar que uma proposição é verdadeira para o primeiro número natural (geralmente 0 ou 1) e, em seguida, provar que, se ela é verdadeira para um número natural arbitrário $k$, então também é verdadeira para $k+1$, poderemos concluir que a proposição é verdadeira para todos os números naturais.
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Indução vulgar

A indução vulgar é uma generalização após a verificação de que uma propriedade é válida em alguns casos particulares, o que pode levar a sérios enganos na Matemática, porque não prova que a propriedade é válida para todos os números naturais. Vejamos alguns exemplos.

Exemplo 1:

Considere a relação $y=2^{2^n}+1$, com $n \in \mathbb{N}$.

Temos:
$n=0 \rightarrow y=2^{2^0}+1 = 2^1+1=3$
$n=1 \rightarrow y=2^{2^1}+1 = 2^2+1=5$
$n=2 \rightarrow y=2^{2^2}+1 = 2^4+1=17$
$n=3 \rightarrow y=2^{2^3}+1 = 2^8+1=257$
$n=4 \rightarrow y=2^{2^4}+1 = 2^{16}+1=65.537$

Os números $y$ encontrados são primos. Fermat (1601-1665) acreditou que a fórmula acima fornecia sempre números primos, qualquer que fosse o valor natural atribuído a $n$. Esta indução é falsa, pois Euler (1707-1783) mostrou que para $n=5$, obtém-se:
$$
y = 2^{2^5}+1 = 2^{32}+1 = 4.294.967.297
$$
Esse número não é primo, pois é divisível por 641:
$$
4.294.967.297 = 641 \times 6.700.417
$$
Logo, a fórmula de Fermat realmente fornece números primos, mas para alguns casos apenas.

Exemplo 2:

Dada a relação $\displaystyle y=-\frac{n^3}{6} + \frac{3n^2}{2}-\frac{7n}{3}+3$, com $n\in \mathbb{N}^*$.

Temos:
$\displaystyle n=1 \rightarrow y=-\frac{1^3}{6}+\frac{3\cdot 1^2}{2}-\frac{7\cdot 1}{3}+3 = 2$

$\displaystyle n=2 \rightarrow y=-\frac{2^3}{6}+\frac{3\cdot 2^2}{2}-\frac{7\cdot 2}{3}+3 = 3$

$\displaystyle n=3 \rightarrow y=-\frac{3^3}{6}+\frac{3\cdot 3^2}{2}-\frac{7\cdot 3}{3}+3 = 5$

$\displaystyle n=4 \rightarrow y=-\frac{4^3}{6}+\frac{3\cdot 4^2}{2}-\frac{7\cdot 4}{3}+3 = 7$

Uma conclusão precipitada é de que a fórmula fornece números primos $\forall  \in \mathbb{N}^*$. Mas essa indução também é falsa, pois:

$\displaystyle n=5 \rightarrow y=-\frac{5^3}{6}+\frac{3\cdot 5^2}{2}-\frac{7\cdot 5}{3}+3 = 8$

É necessário, portanto, dispor de um método com base lógica que permita demonstrar a validade de uma proposição para todos os números naturais.

Vamos considerar a igualdade:
$$
1+3+5+\cdots +(2n-1) = n^2
$$
Para todo $n \in \mathbb{N}^*$ essa igualdade expressa a propriedade: "a soma dos $n$ primeiros números ímpares positivos é dada por $n^2$". 

Temos:
$n=1 \rightarrow 1 = 1^2$
$n=2 \rightarrow 1+3 = 4 = 2^2$
$n=3 \rightarrow 1+3+5 = 9 = 3^2$
$\vdots$
$n=10 \rightarrow 1+3+5+\cdots + 19=100=10^2$

Mesmo continuando a verificação para $n=1.000.000$, por exemplo, não fica provado que a fórmula é válida para todo $n$ natural.

Princípio da indução finita

Para provarmos que uma relação é válida para todo $n \in \mathbb{N}^*$ empregamos o princípio da indução finita, cujo enunciado pode ser escrito como:

Uma proposição $P(n)$ é aplicável a um número natural $n$, para todo $n \in \mathbb{N}$, com $n \geq 0$, quando:

i) $P(n_0)$ é verdadeira, isto é, a propriedade é válida para $n=n_0$, e

ii) Se $k \in \mathbb{N}$, $k \geq n_0$ e $P(k)$ é verdadeira, então $P(k+1)$ também é verdadeira.

Então a proposição $P(n)$ é verdadeira para todo $n \geq n_0$.

O princípio da indução finita consiste em duas etapas:

1 - Base de indução: Demonstrar que a proposição é verdadeira para o menor número natural, geralmente $P(0)$ ou $P(1)$.

2 - Passo indutivo: Demonstrar que, se a proposição é verdadeira para um número natural arbitrário $k$, então ela também é verdadeira para $k+1$.

Se ambas as etapas forem cumpridas, podemos concluir que a proposição $P(n)$ é verdadeira para todos os números naturais $n$.

Exemplo 3:

Vamos provar que a soma dos $n$ primeiros naturais ímpares é um quadrado:
$$
1+3+5+\cdots +(2n-1) = n^2
$$

Base de indução:
Vamos verificar que $P(1)$ é verdadeira:

$n=1 \rightarrow 1 = 1^2$

Passo indutivo:
Vamos admitir que a proposição é verdadeira para um número natural arbitrário $k$, ou seja, que $P(k)$ é verdadeira, com $k \in \mathbb{N}^*$.

A hipótese da indução é:
$$
\color{red}{1+3+5+\cdots + (2k-1)}=k^2 \tag{1}
$$
Provemos que, se $P(k)$ é verdadeira, então $P(k+1)$ também é:
$$
1+3+5+\cdots + (2k-1)+\Big(2(k+1)-1\Big) = (k+1)^2\\
\ \\
1+3+5+\cdots (2k-1)+2k+2-1 = (k+1)^2\\
\ \\
\color{red}{1+3+5+\cdots + (2k-1)}+(2k+1) = (k+1)^2
$$
Da equação $(1)$, temos que:
$$
1+3+5+\cdots + (2k-1)=k^2
$$
Substituindo na equação anterior, temos:
$$
k^2 + (2k+1) = (k+1)^2
$$
O que é igual a:
$$
(k+1)^2 = (k+1)^2
$$
Veja outra demonstração para esta proposição:

Exemplo 4:

Vamos provar que a soma dos $n$ primeiros números naturais é dada por:
$$
S(n) = \frac{n(n+1)}{2}
$$

Base de indução:
Vamos verificar que $S(1)$ é verdadeira:
$$
n=1 \rightarrow = \frac{1(1+1)}{2} = \frac{2}{2} = 1
$$

Passo indutivo:
Vamos assumir que a proposição é verdadeira para um número arbitrário $k$, ou seja, que $S(k)$ é verdadeira para $k \in \mathbb{N}^*$.

A hipótese da indução é:
$$
\color{red}{1+2+3+\cdots +k }= \frac{k(k+1)}{2} \tag{2}
$$
Provemos que, se $S(k)$ é verdadeira, então $S(k+1)$ também é:
$$
1+2=3+\cdots + k + (k+1) = \frac{(k+1)\Big((k+1)+1\Big)}{2}\\
\ \\
\color{red}{1+2+3+\cdots + k} + (k+1) = \frac{(k+1)(k+2)}{2}
$$
Da equação $(2)$, temos que:
$$
1+2+3+\cdots +k= \frac{k(k+1)}{2}
$$
Substituindo na equação anterior, temos:
$$
\frac{k(k+1)}{2} + (k+1) = \frac{(k+1)(k+2)}{2}\\
\ \\
\frac{k(k+1)+2(k+1)}{2} = \frac{(k+1)(k+2)}{2}\\
\ \\
\frac{(k+1)(k+2)}{2} = \frac{(k+1)(k+2)}{2}
$$

Referências:

  • Fundamentos de Matemática Elementar V1 - Gelson Iezzi

Download:

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Veja mais:

COMO REFERENCIAR ESSE ARTIGO: Título: O princípio da indução finita. Publicado por Kleber Kilhian em 06/07/2024. URL: . Leia os Termos de uso.


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